quarta-feira, 30 de junho de 2010

Para entender o Universo

Projeto hispano-brasileiro construirá telescópio para estudar a teoria da energia escura, uma das possíveis explicações para o fato de o cosmos se expandir de forma acelerada

(Correio Braziliense) Os telescópios funcionam como uma extensão dos olhos humanos direcionada ao espaço, capaz de enxergar objetos a milhares de quilômetros da Terra. Cada vez mais modernos, esses equipamentos são considerados fundamentais para testar novas teorias sobre a formação e o comportamento do cosmos, exatamente o principal objetivo do projeto hispano-brasileiro Javalambre PAU Astrophysical Survey (J-PAS), que prevê a construção de um telescópio específico para o estudo da energia escura, considerada uma das variáveis fundamentais da expansão do Universo.

A teoria da energia escura é bastante controversa e recente, tendo cerca de 10 anos. Surgiu a partir da comprovação de que o Universo se comporta de maneira exatamente oposta da que os cientistas imaginavam. Em vez de se expandir cada vez mais lentamente — como era de se esperar, pois a gravidade exercida pelos corpos que compõem o cosmos deveria frear esse movimento —, o Universo na verdade evolui de forma cada vez mais veloz.

Essa constatação foi possível graças à observação de que as supernovas mais longínquas da Terra apresentam a luz mais tênue do que seria de se esperar. Ou seja, elas estão a uma distância maior do que a prevista. O fato deixou os cientistas surpresos e uma das teorias que surgiram foi a de que alguma forma de energia — denominada energia escura — seria responsável pela aceleração imprevista.

O pesquisador do Observatório Nacional (ON) e participante do J-PAS Jaílson Alcaniz conta que a descoberta causou na comunidade científica uma surpresa comparável à que uma pessoa sentiria se jogasse um objeto para o alto e não o visse mais retornar ao chão. “Uma combinação impressionante de resultados observacionais vem revelando consistentemente que o Universo está se expandindo aceleradamente, em vez de desacelerar. Mas sendo a gravidade uma força atrativa, as galáxias deveriam frear a velocidade de expansão, conforme ensinado durante décadas por físicos e astrônomos”, diz.

Para investigar a energia escura, uma equipe de cientistas de Espanha e Brasil participará da construção de um telescópio de 2,5m de diâmetro, a ser erguido em Teruel, cidade do país europeu. Ao todo, 15 pesquisadores brasileiros de várias instituições, coordenadas pelo ON, integram o projeto. O telescópio será formado por uma câmera com 14 dispositivos de carga acoplada (CCDs) de 10,5 mil pixels cada, sendo capaz de gerar imagens de 1,5GB. De acordo com os especialistas, a câmera será, em grande parte, concebida e gerenciada pelo Brasil. Isso significa que o investimento deve resultar em retorno imediato para o país em termos de inovação e tecnologia, que poderá ser explorado pela indústria nacional.

Observações
Depois de pronto, o telescópio será instalado no Pico de Buitre, situado na Serra de Javalambre, a 1.957m de altitude. “A região é uma das mais escuras da Europa”, garante o pesquisador do ON e coordenador principal do projeto no Brasil, Renato Dupke. Segundo ele, o telescópio ainda cobrirá uma quantidade sem precedentes de áreas(1) astronômicas. “Desde asteroides, passando por estrelas, nossa galáxia, aglomerados e superaglomerados de galáxias, supernovas, quasares, entre várias outras”, enumera.

O início das observações está previsto para 2012, sendo que os resultados preliminares devem ser divulgados dois anos depois. “A previsão é que todo o projeto custe por volta de 17 milhões de euros. Os espanhóis já levantaram cerca de 15 milhões de euros para iniciar a construção do telescópio. O Brasil entrará com os custos para a construção da câmera especial”, afirma Renato Dupke.

Para ele, a parte nacional do projeto (PAU-Brasil) permitirá que os pesquisadores do país tenham uma experiência direta na organização e na realização de um projeto de grande porte. “Temos a presença de brasileiros nos comitês de deliberação, em setores-chave da organização e como coordenadores de grupos de trabalho. Além disso, o Brasil terá prioridade no uso do equipamento, o que permitirá uma competição mais justa entre pesquisadores brasileiros e de países mais ricos”, informa o cientista.

Cada vez mais longe
O primeiro telescópio apontado para o céu pelo cientista Galileu Galilei, há cerca de 400 anos, foi o pontapé inicial para o surgimento de equipamentos cada vez mais modernos. Segundo a astrônoma brasileira que atua na Agência Espacial Norte Americana (Nasa) Duilia de Mello, hoje temos uma grande quantidade de telescópios de última geração e, por meio deles, tem sido possível visualizar objetos cada vez mais distantes. “Atualmente, os telescópios estão maiores e os detectores estão mais sensíveis. Com isso, conseguimos visualizar objetos nos confins do universo, o que não era possível antes”, destaca.

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