quarta-feira, 16 de abril de 2014

Brasil pode ficar de fora de consórcio astronômico

Demora na ratificação de acordo de adesão ao ESO prejudica cientistas e empresas


(O Globo) A demora na ratificação de tratados internacionais no país pode levar o Brasil a perder a chance de se juntar a um centro de referência mundial em astronomia. Até o momento, o Congresso não ratificou e, portanto, o Executivo não sancionou o acordo para adesão do país ao Observatório Europeu do Sul (ESO), maior consórcio de observatórios astronômicos do mundo.

O acordo, assinado em dezembro de 2010 pelo então ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação Sergio Rezende, prevê o desembolso total de € 270 milhões (cerca de R$ 830 milhões) ao longo de dez anos. No entanto, até o momento não saiu um único tostão dos cofres públicos, já que o texto está parado na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.

Apesar da lentidão e da situação de “inadimplência” do Brasil — o primeiro país fora da Europa a concordar em se juntar ao ESO como Estado membro —, desde o fim de 2010 os astrônomos brasileiros foram autorizados a propôr projetos de utilização do conjunto de telescópios e equipamentos instalados no Chile em igualdade de condições com os cientistas dos atuais Estados membros do consórcio. Por outro lado, a não ratificação do acordo poderá impedir a participação de empresas brasileiras nas licitações para a construção de infraestrutura e compra de novos equipamentos pela instituição.

— Por estarem próximas do Chile, as empresas brasileiras têm mais chances de ganhar as concorrências para as obras e as compras do observatório. Estima-se que 75% do valor investido no consórcio retornem ao país na forma de contratos, pesquisas e nova tecnologia — disse o gerente executivo de Comércio Exterior da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Diego Bonomo.

Busca por vida fora da Terra
Bonomo destacou, por exemplo, que os pagamentos prometidos pelo Brasil acelerariam a construção do European Extremely Large Telescope (E-ELT), que será o maior telescópio do mundo e está orçado em € 1 bilhão (R$ 3,07 bilhões). Com um espelho de 39 metros de diâmetro, o instrumento poderá captar 100 milhões de vezes mais luz que o olho humano e será ao menos dez vezes mais poderoso que os principais telescópios hoje em operação. Com ele, os cientistas esperam estudar a atmosfera e encontrar os primeiros sinais de vida em planetas extrassolares, isto é, que orbitam outras estrelas que não o Sol, além de ajudar a responder mistérios sobre a origem do Universo e a natureza da matéria e da energia escuras. Ficar de fora destas importantes pesquisas preocupa a comunidade científica brasileira.

— Não quero nem pensar nessa possibilidade, pois chegamos tão perto. Das quatro comissões que estão na Câmara, o texto já foi aprovado em três delas — disse a presidente da Sociedade Astronômica Brasileira (SAB), Adriana Válio.

Para o astrofísico José Leonardo Ferreira, do Instituto de Física da Universidade de Brasília (UnB), a entrada do Brasil no ESO vai permitir um salto de qualidade do país no que se refere à utilização de grandes observatórios e laboratórios. Ele lembrou, porém, que o governo brasileiro já tem acordos em outros projetos com os Estados Unidos e nações europeias.

— Esse seria mais um passo importante para a comunidade científica brasileira. O Brasil não pode perder esse filão — ressaltou Ferreira.

Missão empresarial
A presidente da SAB explicou que é preciso incluir alguma verba, mesmo que simbólica, no texto do acordo que está na Câmara. Todavia, consultado pelo GLOBO, o Ministério do Planejamento informou que desembolsos só serão previstos no Orçamento quando o acordo, ainda apenas um protocolo de intenções, for ratificado pelo Congresso e sancionado pela Presidência.

Procurado, o relator da matéria na Comissão de Finanças da Câmara, deputado Afonso Florence (PT-BA), não retornou as ligações até o início da noite de ontem.

Enquanto aguarda uma definição do processo, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) está de olho nos potenciais negócios gerados pela adesão do Brasil ao ESO e organiza uma missão de empresários dos setores aeroespacial, construção civil, eletroeletrônico e equipamentos óticos, além de parlamentares envolvidos no processo, a um dos observatórios do consórcio na região de Paranal, no Deserto do Atacama.

Um dos objetivos é ver de perto equipamentos avançados como o Very Large Telescope (VLT). O VLT é formado por quatro telescópios com espelhos de 8,2 metros de diâmetro cada que podem atuar de forma independente ou em conjunto, sendo capaz de ver o equivalente a faróis de um carro na Lua.
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E mais:
O Brasil e o ESO: perdendo as oportunidades (e a graça) (Cesar Baima - O Globo)

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