terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

"Se o Brasil pretende ser grande na astronomia, é preciso unir-se ao ESO"

Em artigo exclusivo para o site de VEJA, Brian Schmidt, laureado com o Prêmio Nobel de Física de 2011, defende a entrada do país no consórcio que controla os maiores telescópios do mundo



(Veja) O ingresso do Brasil no ESO (Observatório Europeu do Sul) vai ao encontro dos interesses astronômicos de longo prazo do país. Se o Brasil pretende ser grande na astronomia, unir-se ao ESO tornaria essa pretensão possível.

Não concluir este processo seria, no momento, a coisa mais negativa que o Brasil poderia fazer para sua comunidade científica. O ESO proporciona um vasto portfólio de instalações astronômicas. Elas são únicas em qualidade e profundidade. O ESO — maior do que qualquer outra entidade astronômica — tem telescópios de alta performance, instrumentos de última geração e software de altíssima qualidade.

O ESO também tem um histórico favorável ao engajar a indústria de alta tecnologia e os laboratórios científicos dos países-membros. Um país como o Brasil, que tem boa capacidade em ambas as áreas, teria a oportunidade de trabalhar com outros países no desenvolvimento de tecnologia de ponta. O ESO fornece um caminho natural de colaboração com entidades europeias no campo industrial e acadêmico.

Como membros do ESO, os astrônomos brasileiros terão uma oportunidade fantástica para estar no primeiro plano internacional, trabalhando de casa. As instituições terão mais facilidade em reter ou repatriar astrônomos nativos, e poderão recrutar alguns dos melhores e mais brilhantes ao redor do mundo.

O ESO é formado por um acordo intergovernamental. A organização possui estabilidade para organizar estratégias de longo prazo que não são possíveis em outros modelos. Além disso, as prioridades refletem o desejo de todos os países-membros em vez de desejos individuais desse ou daquele país. Até agora, a estrutura do ESO tem servido seus membros muito bem.

Para se ter uma ideia, a organização desenvolveu os melhores telescópios terrestres que existem. A alternativa — comprar tempo de observação em telescópios descoordenados — tem muitas desvantagens. O número de instalações nas quais o Brasil poderia participar completamente na gestão plena da organização é limitado e, para ter acesso amplo, o país teria que comprar noites em uma série de instalações. Mas essa compra não permite que o Brasil contribua com o planejamento dos projetos e os contratos são relativamente pequenos devido à incerteza de longo prazo desses telescópios. Finalmente, essas alternativas não são sistematicamente coordenadas com outros países, o que leva a formação de um portfólio que serve pouco às necessidades da comunidade astronômica.

O ESO, por outro lado, é visionário em sua perspectiva. Os quatro VLTs são os melhores telescópios do mundo. O telescópio VISTA tem habilidades únicas para rastrear o céu no infravermelho. A organização também é parte do ALMA (junto com Estados Unidos, Canadá e Japão), um radiotelescópio de alta frequência duas ordens de grandeza mais capaz que seus antecessores. O ESO está desenvolvendo o mais ambicioso telescópio, o E-ELT, que vai enxergar o amanhecer do universo. Como conjunto, a organização oferece ao Brasil a infraestrutura astronômica necessária para endereçar as questões mais interessantes da área.

A única desvantagem de se tornar membro do ESO é o custo permanente de longo prazo. Contudo, esse custo proporcionaria excelente retorno para indústria e astrônomos brasileiros. O ESO acordou condições para o Brasil se tornar parte do grupo refletindo o tamanho atual da comunidade astronômica e reduzindo as taxas em relação a países com PIB semelhante. É verdade que os astrônomos brasileiros levarão um tempo até que tirem total vantagem do ESO, mas, no longo prazo, não vejo por que o Brasil não usaria essa oportunidade para se tornar uma potência astronômica. Embora seja uma afirmação de fé dizer que este será o resultado final, não dar esse salto vai tirar do Brasil qualquer chance de chegar ao topo dessa área de fronteira da ciência.

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